
Cristal chegou na minha vida em 2014, com apenas dois aninhos. Lembro, como se fosse hoje, o dia em que fomos buscá-la. Um dos sonhos do meu pai sempre foi ter um gato persa, mas nunca teve coragem de comprar um. Até que, numa conversa com uma amiga dele — que, por acaso, era veterinária —, ela mencionou que tinha dois persas para adoção. Sem nem pensar duas vezes, largamos tudo e fomos.
Havia dois gatos: ela, e um macho branco com a cabecinha meio torta. Cristal estava solta no consultório. Foi amor à primeira vista.
Os anos que se seguiram não foram fáceis, mas ela esteve sempre lá, como minha melhor amiga, companheira e parte intrínseca de mim.
Não tinha medo que a paralisasse. No início, era só ela. Depois, chegaram mais dois, mas ela nunca perdeu o seu lugar de dona da casa. Impunha respeito com uma naturalidade, que chega a ser cômico.
Mesmo nos seus últimos meses, jamais demonstrou fraqueza ou dor. Ela sentia tudo, e por isso, estava sempre perto. Dormíamos sempre lado a lado, como almas de uma vida pautada em amor.
No dia 10 de junho de 2023, ela partiu. Foi um dos dias mais tristes da minha vida. Já tinha vivido um luto difícil antes e, ingenuamente, achei que desta vez seria menos doloroso. Não foi. Doeu tanto quanto da primeira vez. Foi aí que entendi, com uma clareza amarga, que existem feridas que nunca criam pele.